sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Alzheimer: americanos descobrem como ele se espalha


 Experimentos revelam processo infeccioso entre neurônios e muda tratamento da doença

Pesquisadores de duas universidades americanas, Columbia e Harvard, conduziram experiências independentes e paralelas, chegando a uma descoberta surpreendente: o que desencadeia a propagação do mal de Alzheimer no cérebro é uma infecção que se espalha entre neurônios. Os dois experimentos foram feitos com cobaias de laboratório e, ao invés de vírus ou bactérias, os cientistas propagaram pelo cérebro uma proteína conhecida como Tau, que é uma proteína com estrutura distorcida.

A descoberta surpreendente responde a uma pergunta de longa data para as pesquisas médicas e tem implicações imediatas para os tratamentos que hoje estão em desenvolvimento. Os pesquisadores acreditam que outras doenças cerebrais degenerativas, como mal de Parkinson, podem se espalhar de uma forma similar.

Há muito tempo, pesquisadores de Alzheimer sabem que entre os primeiros sintomas do Alzheimer está o surgimento de células cheias da proteína Tau em uma pequena área do cérebro onde as memórias são esculpidas e armazenadas. A doença então se move lentamente para além desta pequena área, para regiões maiores do cérebro, que envolvem memória e raciocínio.

Mas, por mais de um quarto de século, os pesquisadores foram incapazes de decidir entre duas explicações sobre como esta mudança de área poderia ocorrer. Uma das hipóteses é a de que a propagação resulta de a doença ser transmitida de um neurônio para outro, talvez ao longo dos caminhos que as células nervosas usam para se comunicar umas com as outras. A outra hipótese é a de que algumas áreas do cérebro são mais resistentes do que outras e resistem à propagação da doença por mais tempo.

Os novos estudos podem dar uma resposta a este dilema. Eles indicam que é possível produzir uma interrupção da propagação do mal de Alzheimer no cérebro, impedindo a transmissão de uma célula a célula, talvez por meio de um anticorpo que bloqueia o complexo proteico Tau.

Os estudos, feitos de forma independente por pesquisadores das universidades de Columbia e Harvard, envolveu ratos geneticamente modificados, nos quais foram injetadas proteínas humanas do tipo Tau, predominantemente na região entorrinal do córtex cerebral, um pedaço de tecido que se localiza atrás das orelhas e onde as primeiras células começam a morrer quando a pessoa apresenta os primeiros sintomas da doença de Alzheimer. Como era esperado pelos cientistas, as células do córtex entorrinal dos ratos começaram a morrer.
Numa segunda fase, a morte celular e a destruição de neurônios espalharam-se para fora desta área, para outras células neuronais, ao longo da mesma rede. Uma vez que essas outras células não poderiam produzir a proteína humana Tau, a única explicação para o surgimento de proteínas distorcidas do tipo Tau seria a transmissão de uma célula nervosa para outra célula nervosa.

E isso, segundo o neurologista Samuel E. Gandy, diretor associado de pesquisa do Alzheimer Disease Center, em Mount Sinai, instituto de pesquisa pertencente à Escola de Medicina em Nova York, foi "muito inesperado, muito intrigante."

Embora os estudos ainda estejam em estágio muito inicial, com experimentos em camundongos, os pesquisadores dizem esperar que o mesmo fenômeno ocorra em seres humanos, porque os ratos tinham implantado em seu organismo um gene tau humano e a onda progressiva de morte celular também acontece em pessoas com doença de Alzheimer.
O estudo realizado pelos pesquisadores Karen Duff e Scott A. Small Jr, e seus colegas do Instituto Taub para a Pesquisa sobre Doença de Alzheimer e Envelhecimento do Cérebro, na Universidade de Columbia, foi publicado na quarta-feira na revista “PLoS One”. O outro, pelo Dr. Bradley T. Hyman, diretor de Pesquisa do Mal de Alzheimer Center em Massachusetts General Hospital, e seus colegas, vai publicada na revista “Neuron”. Ambos os grupos de pesquisadores foram inspirados pelas observações, ao longo dos anos, de que o Alzheimer começa no córtex entorrinal e depois se espalha.

Mas, disse o Dr. Small, "o que queremos dizer com 'espalha-se'?"

Pesquisadores sabem que algo desencadeia a doença de Alzheimer. O candidato mais provável era uma proteína conhecida como beta-amilóide, que se acumula no cérebro de pacientes com a doença, formando placas rígidas. Mas a proteína beta-amilóide é muito diferente do complexo proteico Tau. Ela é secretada e fica em aglomerados fora das células. Embora os pesquisadores tenham procurado, eles nunca viram evidências de que a beta-amilóide se espalhe de célula para célula em uma rede.

Ainda assim, a doença cria amilóides, o que equivale a um bairro ruim em regiões de memória do cérebro. Em seguida, vem a proteína Tau _ que alguns pesquisadores chamam de "carrasco" _ acumulando-se dentro das células e mata os neurônios. Como algumas células demoram mais que outras para sucumbir à má vizinhança, isso explicaria a propagação da doença no cérebro, e não haveria necessidade de culpar algo estranho, como a propagação da proteína Tau, de célula para célula.

Estudos em humanos, porém, não determinaram se essa hipótese estava correta. Autópsias e exames de imagem cerebral foram "indiretos e inconclusivos", segundo Small. Observar o cérebro de pessoas que morreram com a doença, de acordo com o Dr. Duff, é como olhar para um carro destruído e tentar descobrir o motivo do acidente. Freios com defeito? Barra de direção quebrada?

A questão de qual hipótese estava correta _ a da proteína Tau espalhando-se de célula para celular, ou a de uma região danificada no cérebro por causa de células nervosas com diferentes vulnerabilidades _ ficou sem resposta. O doutor Hyman tentou por 25 anos encontrar uma boa maneira de enfrentar o dilema. Uma de suas idéias era encontrar um paciente com uma lesão vascular cerebral, e outro que houvesse segmentado o córtex entorrinal do resto do cérebro em consequência da doença. Se o paciente tivesse desenvolvido a doença de Alzheimer no córtex entorrinal _ e mantido a doença contida nesta região _ ele teria provas de que a doença se espalha apenas como uma infecção. Mas nunca encontrou tais pacientes.

A solução veio quando os pesquisadores foram capazes de desenvolver camundongos geneticamente modificados que expressam a proteína Tau humana anormal, mas apenas em seus córtex entorrinal. Aqueles ratos haviam oferecido a maneira mais clara para conseguir uma resposta, de acordo com John Hardy, um pesquisador de Alzheimer da London College University, que não estava envolvido em um dos novos estudos.

Há uma outra vantagem, também, segundo o Dr. Hyman. Os ratos deram ao pesquisadores uma ferramenta para testar maneiras de bloquear a disseminação da Tau. Ele foi incisivo: "É uma das coisas sobre as quais estamos animados."

Se a Tau se espalha de neurônio para neurônio, diz o Dr. Hardy, pode ser necessário para bloquear a produção de beta-amilóide, o que parece levar a propagação do mal de Alzheimer a um impasse. Ele e outros cientistas também estão perguntando se outras doenças degenerativas espalham-se através do cérebro porque as proteínas passam de célula nervosa a célula nervosa.

O doutor Hardy acredita ter evidências de que o mesmo pode acontecer na doença de Parkinson. Dois pacientes de Parkinson tratados tiveram implantadas no cérebro células neuronais fetais para substituir neurônios mortos e moribundos. Quando os pacientes morreram, anos mais tarde, as autópsias mostraram que eles ainda tinham as células fetais, mas tinham bolas que continham uma proteína do mal de Parkinson, a sinucleína. A maneira mais óbvia de explicar o que ocorreu, segundo os pesquisadores, é verificar se a proteína tóxica se espalhou a partir de células doentes do paciente para as células saudáveis fetais. Mas eles não podem descartar a hipótese de má-vizinhança. Agora, segundo o doutor Hardy, a questão da disseminação do Alzheimer pode estar resolvida.


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